por Thiago Fonseca.
No dia em que Mestre Sambo, já de certa idade, foi pai do seu décimo quarto filho,
a mulher perguntou-lhe que nome iam dar à criança.
Ele, já sem ideia, respondeu: Tanto faz!
E assim ficou.
Da Zambézia surgem alguns dos nomes mais intrigantes de Moçambique.
O Tanto Faz cresceu numa vila de pescadores na barra de Tangalene e estudou numa escola em Quelimane até ao dia em que o pai precisou dele para ajudar a família a trabalhar na pesca.
O espírito de Sambo era metade homem, metade peixe, mas o corpo do Mestre já estava cansado do mar.
Mestre Sambo não apenas era um pescador experiente.
Ele também tinha aprendido a arte de construir barcos que vendia a outros pescadores, actividade a que passou a dedicar-se exclusivamente.
Tanto Faz passou a ir todos os dias à pesca. Tanto fazia, não importava que condições estivessem, ele ia.
Vento, chuva, bom tempo, tanto faz.
O rio dos bons sinais e Mestre Sambo já lhe tinham transmitido grandes ensinamentos de vida.
É por isso que Tanto Faz, faz tanto.
Ele sabia que o único lugar onde a palavra dinheiro vinha antes da palavra esforço era naquele dicionário que leu quando andava na escola.
A vida prática ensinava o contrário dos livros.
FAZER PARA COLHER
Alguma vez viu um pescador ficar sentado em terra à espera que lhe pagassem para ele pegar no barco e ir à pesca?
Infelizmente, é isto que acontece com a maior parte das pessoas nas empresas.
Quase ninguém procura trabalho. Procura um emprego.
E passa o dia à espera que o chefe passe tarefas. E se não passar, tanto faz.
Mas o Tanto Faz sabe que na vida, as coisas não funcionam assim.
Se ele não sair para o mar, nada acontece.
Quem trabalha em marketing tem muito a aprender com quem sabe realmente vender bem o seu peixe. O pescador não espera. Sai no barco, vai à pesca.
E depois volta com o peixe fresco para vender.
Só depois disso é que recebe. Não antes. Porque o clientes só compram quando vêem.
Mestre Sambo estava impressionado com o filho que tanto faz pela família.
Tanto Faz era-o apenas no nome.
Era um homem de fazer muito e de muitas iniciativas.
Ajudou o pai a construir mais dois barcos e, em conjunto com o seu irmão mais novo e um amigo, tinham uma mini-frota para pescar camarão.
Os melhores restaurantes de Quelimane vinham à vila comprar os camarões deles.
Um dia, o Senhor Renard, empresário francês que parou em Quelimane para almoçar antes de ir passar uma semana na praia de Zalala, ao provar aqueles camarões frescos perguntou onde poderia comprar mais.
O dono do restaurante respondeu sem pestanejar: Tanto Faz.
Ele não entendeu à primeira e pensou que poderia comprar em qualquer lugar.
Mas no mercado de peixe que tinha visitado nessa manhã não viu camarões assim, tão bons, grandes e frescos.
Renard estava de férias com a esposa, mas nem tanto.
Afinal, patrão não dorme, descansa.
Foi assim que os destinos dele e do Tanto Faz se cruzaram.
Quando Renard chegou a Tangalene, Tanto Faz já tinha sete barcos artesanais e outro em construção e conseguia pescar em média mais de 300 quilos de camarão por mês.
Foi nesse momento que Renard propôs importar todo o camarão do Tanto Faz para vender na Europa.
Chegaram até a assinar um contrato e Renard apoiou-o com os frigoríficos.
QUEM SE IMPORTAR TEM DE EXPORTAR
Com a venda do camarão para a Europa, Tanto Faz não recebe em qualquer moeda.
Recebe em divisas que traz para o país, fruto do seu trabalho e da exportação do seu produto local.
Nas grandes plataformas em França como o Intermarché, na secção do peixe há uma placa que se destaca: “Fresh Prawns from Mozambique”. Vendidos a preços elevados.
Na Zambézia não há apenas camarão. Esta região sempre foi um centro de trocas comerciais entre as populações da região e outros povos estrangeiros desde o século XVI.
A província tem muitas riquezas, como o chá, a cana-de-açúcar, o algodão, o sisal, o cajú, o arroz e ainda o maior palmar do mundo.
O que falta é entender que chegou o momento de exportar coco.
Mas para isso temos de pôr a cuca a pensar.
Não é de fora para dentro. É de dentro para fora.
Não é Think Global, Act Local. É Think Local, Act Global.
É isso que Moçambique tem de fazer.
Qualquer marca global tem de vir sempre de algum lugar.
Camarão de Moçambique é uma marca. Mesmo que não tenha sido criada, ela nasceu.
É sinónimo de qualidade e confiança.
O Tanto Faz, tanto faz pelo país que nem sequer imagina o quanto.
Quando o nome de Moçambique aparece nos menus dos melhores restaurantes do mundo, “Mozambique Prawns”, ele está a chamar a atenção dos investidores para o país.
Para a marca Moçambique.
Há mais pessoas como ele. Que fazem.
Num mundo global, o produto local nunca foi tão importante.
E há tando para fazer.
Nesta altura, mais do que nunca todos precisamos de produzir.
Fica a pergunta: você vai fazer alguma coisa?
Ou tanto faz?
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Thiago Fonseca - Chief Creative Officer and Partner of Agência GOLO / CEO of Grupo LOCAL Mozambique
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